Facções criminosas no Ceará: por que o estado virou alvo e como a violência mudou

  • 16/11/2025
Como ocorreu a ascensão das facções criminosas no Ceará Desde 2015, o Ceará tem vivenciado uma mudança significativa na atuação das facções criminosas. A observação é de Artur Pires, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC). De acordo com o especialista, antes concentrados no tráfico atacadista e em operações nos portos e aeroportos, esses grupos criminosos passaram a ocupar ostensivamente as periferias urbanas, marcando territórios e ampliando sua influência local. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Ceará no WhatsApp O resultado disso são as diversas ações violentas realizadas pelas facções, como agressões e mortes, expulsões de moradores em Fortaleza e outras cidades do estado, extorsão e tentativa de monopólio de serviços e comércios. Desde fevereiro, os provedores de internet do Ceará estão sendo alvos de uma série de ataques promovidos por uma facção criminosa, que está cobrando das empresas parte do valor dos serviços prestados. Reprodução LEIA TAMBÉM: Moradores abandonam vila para fugir de facções em Pacatuba Vilarejo do Ceará vira 'território-fantasma' após expulsão de moradores A boa localização geográfica do Ceará e uma infraestrutura eficiente colocam o estado na mira dos criminosos, que querem expandir o tráfico de drogas e apostar em outras formas de escoar suas mercadorias ilícitas (entenda mais abaixo). No meio do fogo cruzado, moradores vivem clima de medo e tensão. Uma vila da cidade de Pacatuba, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), por exemplo, tornou-se um território “fantasma” após criminosos expulsarem os moradores. Uma pessoa foi presa por suspeita de envolvimento no caso. Ouça o que diz um morador: Morador relata cenário de medo próximo a vila onde moradores foram expulsos por facção Esta não é, no entanto, a única maneira encontrada pelas facções para demonstrar força e poder. No início de 2025, o Ceará enfrentou uma série de ataques a provedores de internet. Os criminosos buscavam monopolizar o serviço e, por isso, estavam cobrando taxas para as empresas atuarem. Carros e comércios foram incendiados. Outro caso é a expulsão de moradores de um distrito inteiro de Morada Nova, cidade do interior cearense. Uiraponga tinha 300 famílias que foram obrigadas a deixar suas casas após ameaças de facções. Um relatório do Núcleo de Inteligência da Polícia Civil do Ceará obtido pela TV Verdes Mares revela que de janeiro de 2024 a setembro de 2025, a Secretaria da Segurança Pública (SSPDS) registrou 219 casos de "deslocamentos forçados" de moradores em todo o Ceará, como a pasta se refere às expulsões. Situações como essa revelam que o estado do Ceará pode estar na mira dos criminosos. Nesta reportagem, entenda por que isso acontece e quais são as saídas. Das gangues à ascensão das facções Pichações revelam expansão das facções criminosas no estado. Reprodução Antes de abordar como o Ceará se tornou um ponto estratégico para organizações criminosas, é preciso relembrar como ocorreu a ascensão das facções no Estado até chegar ao cenário atual, marcado por diversos grupos disputando o controle de territórios. Nas décadas de 1980 e 1990, a violência era fragmentada, com a atuação de pequenas gangues locais formadas por grupos de jovens envolvidos em disputas territoriais. Segundo o sociólogo Luiz Fábio Paiva, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV/UFC), a partir de 2015 foi observada a presença das primeiras facções no Estado. “Havia ações de facções como o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital, mas elas eram voltadas para esquemas criminais, como assaltos a bancos, sequestros e alguma articulação dentro das unidades prisionais. Era uma dimensão mais geral”, explicou Luiz Fábio Paiva. Esse cenário mudou em 2016, quando as facções começaram a se fortalecer. Foi nesse mesmo período que surgiu a facção Guardiões do Estado (GDE), originária da periferia de Fortaleza, que chegou a ser uma das maiores do Estado antes da expansão do Comando Vermelho (CV), ocorrida em setembro deste ano. “Em 2016, as facções buscaram exercer sua força. No início, elas controlavam ações como assaltos e a eliminação de desafetos, até escalarem para a proibição da circulação de moradores em determinadas áreas, causando uma certa ‘fronteirização’”, afirmou o sociólogo. Com o fortalecimento dessas organizações, as facções passaram a expulsar moradores considerados simpatizantes de grupos rivais ou parentes de desafetos. “A gente vê uma penetração desses grupos na vida e no cotidiano dos moradores e uma certa dificuldade do Estado em conseguir coibir esse tipo de conduta. Nós não estamos mais falando de grupos que apenas controlam atividades criminosas, mas de organizações que extrapolam essa atividade para exercer força sobre as comunidades e seus estilos de vida”, ressaltou o pesquisador. Para o sociólogo, a ascensão das facções no Ceará está ligada, entre outros fatores, à forma como esses grupos se articulam. As facções possibilitaram conexões e criaram uma comunicação entre diversos criminosos atuando em diferentes cidades e estados. Isso faz com que tenham força, porque estão conectados, atuando em rede, o que lhes permite exercer poder local, apoiados e articulados por redes nacionais. Ceará tem boa localização e infraestrutura O interesse das facções criminosas pelo Ceará ocorre porque o estado ocupa uma posição estratégica no Brasil e tem uma boa infraestrutura de portos, aeroportos e rodovias. Despachar as mercadorias partindo do Ceará para países da Europa, África e América do Norte é considerado mais barato. Quanto menor a distância, menor é o custo, diz Artur. "O porto do Pecém, por exemplo, não é um porto qualquer. É um porto muito bem desenvolvido que tem ligações internacionais, inclusive uma parceria com o Porto de Roterdã, um dos maiores da Europa. O aeroporto Pinto Martins também é um grande exportador de cargas do Brasil, e Fortaleza cada vez mais tem voos internacionais. Isso é muito importante para as facções, porque elas podem enviar, escoar suas mercadorias para o mundo todo (...) Fora a localização, o Ceará é muito estratégico pela infraestrutura", explica Artur Pires. Os especialistas consultados pelo g1 apontam que os criminosos estão buscando outras maneiras de ganhar dinheiro para além do tráfico de drogas e, por isso, agem extorquindo comerciantes e tentam monopolizar comércios e serviços. Em agosto deste ano, por exemplo, criminosos do Comando Vermelho (CV) tentaram controlar a venda de água de coco e de outros produtos na Avenida Beira-Mar, principal ponto turístico de Fortaleza. "O que aconteceu na Beira-Mar, além de uma extorsão, era uma prática em que eles diziam que os comerciantes só poderiam comprar num depósito indicado pela facção. Isso configura uma monopolização de serviços, como, por exemplo, serviço de água, de internet nesses territórios, serviço de TV a cabo clandestino. Tudo está monopolizado a partir dessa territorialização das facções", explica o pesquisador. Política de combate ao crime é ineficiente, diz especialista Ceará fecha 2024 com maior índice de homicídios Para Artur Freitas, a gestão do governador Elmano (PT) está sendo ineficiente no combate às facções criminosas. Ele aponta que é preciso pensar a segurança pública em diálogo com o lazer, moradia, saúde e educação, "para que num processo de médio e longo prazo a gente dispute simbolicamente a subjetividade desses jovens que estão achando o discurso da facção muito mais encantador e atraente do que o discurso da cidadania". "A política pública de segurança nas últimas décadas tem sido qual? Contrata policiais, compra viaturas, compra armas e constrói prédios, delegacias, Centros Integrados de Segurança e tudo isso. Eles já se mostraram muito ineficientes para conseguir acompanhar a dinâmica do que é a movimentação faccional", diz Artur. A superlotação dos presídios também é outro fator que intensifica o problema, pois é lá onde se formam e se fortalecem muitos grupos criminosos. Com o abarrotamento das prisões, Artur pontua que as facções só se desenvolvem. "Na verdade, o processo está caminhando para piorar. Se não mudar a proposta de segurança pública, algo de fato bem diferente do que está aí, em curto prazo, é impossível melhorar", acrescenta. Policiais penais frustram fuga de 12 presos da Unidade Prisional 3, em Itaitinga. Reprodução O sociólogo Luiz Fábio Paiva também acredita que o Estado precisa mudar a forma de encarar o problema para conseguir enfrentá-lo com mais eficácia. “O principal erro é pensar que a facção é apenas um fenômeno criminal, restrito à atividade criminosa. Acreditar que basta combater e coibir por meio do aparato policial ou judicial para resolver o problema é um engano. As facções são um fenômeno social. É preciso entender as relações que elas criam, a maneira como agregam pessoas e desenvolvem uma capacidade de articulação e mobilização que é massiva”, concluiu o especialista. 🎧 Entenda mais sobre o poder das facções no Nordeste neste episódio do podcast O Assunto: Quase 2 mil pessoas capturadas entre janeiro e setembro deste ano Operação policial cumpre 12 mandados de prisão contra membros do Comando Vermelho no Ceará TV Verdes Mares/Reprodução Em nota, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS-CE) disse que a expulsão de moradores é uma prática registrada em vários estados do país e "é parte da forma de atuação de grupos criminosos quando há acirramento entre eles". "Vem sendo combatida no Ceará a partir do mapeamento, monitoramento e prisões de suspeitos", comenta a pasta. Ainda de acordo com a secretaria, pelo menos 45 suspeitos de expulsões foram presos de agosto até o dia 8 de novembro no estado e 1.851 pessoas foram capturadas em flagrante ou por mandado por integrar organizações criminosas entre janeiro e setembro deste ano no Ceará. "O número representa um aumento de 86,6% em comparação com o mesmo período do ano passado, quando houve 992 capturas. Somente em setembro deste ano, o número de prisões e apreensões por integrar organização criminosa cresceu 279,8% em relação ao mesmo período de 2024". O g1 ainda questionou como a pasta pensa a segurança pública aliada a temas como educação, saúde, moradia e lazer - levando em conta o diálogo com outras secretarias - e o que deve ser feito para que moradores expulsos de casa que ainda não retornaram para suas residências tenham esse direito garantido. Estas questões, no entanto, não foram respondidas. Sete pessoas morrem em confronto com a polícia em Canindé De acordo com estudiosos do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), atualmente o Ceará vive um cenário de disputa entre duas facções cariocas: o CV e o TCP. Essa nova configuração intensifica os conflitos e redesenha o mapa do crime organizado no estado. Confira: Diferenças estratégicas entre PCC e CV no Ceará Assista aos vídeos mais vistos do Ceará:

FONTE: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2025/11/16/faccoes-criminosas-no-ceara-por-que-o-estado-virou-alvo-e-como-a-violencia-mudou.ghtml


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